terça-feira, 9 de julho de 2013

O espetáculo multimídia de orientação fictícia


Thörn é editor do fazine STORNO
Tradução feita pra este blogue

A primeira banda chamada de industrial foi Throbbing Gristle. O grupo se formou com os restos de um grupo performático conhecido como COUM de 1976. Os seus três membros abandonaram o mundo da arte para analisar as possibilidades do mundo da música. Um dos membros, Genesis P. Orridge, em uma entrevista na Re/Search/ 6/7 disse o seguinte quanto ao desejo do grupo: "Up till then the music had been kind of based on the blues and slavery, and we thought it was time to update it to at least Victorian times - you know, the Industrial Revolution. /.../ I mean, we just thought there was a whole untapped area of imagery and noise wich was suggested when we thought of Ðindustrialð." A música e o estilo de Throbbing Gristle inspirou muitos outros a começar a compor música industrial e pouco a pouco foi formado um cenário com selos, bandas e fãs.
No final dos anos 60 e início dos anos 80 começou a crescer uma forma de música industrial estruturada com muito mais ruídos - a eletrônica de potência. Os primeiros artistas deste gênero foram projetos como Whitehouse, Ramleh e Sutcliff Jugend. Se quisermos caracterizar este gênero rapidamente, diríamos que é um zunido monótono com distorções, baixos de baixa frequência, gritos distantes e em alguns momentos seleção de vozes com música "normal". Esta música intensiva e difícil de escutar tem muitas vezes andada de mãos dadas com ideias de extremismo político, ódio, psicopatia, assassinos seriais, destruição e catástrofe.
Os herdeiros dos primeiros grupos têm trabalhado em questões semelhantes e os últimos grupos como Grey Wolves, Con-Dorn, Genocide Organ, Brighter Death Now e Anenzephalia utilizaram muitas vezes filmes como parte evidente dos espetáculos ao vivo, com qual frequência os antigos utilizavam estes efeitos eu não sei. No entanto, atualmente são um componente óbvio nos concertos. As imagens ou os filmes exibidos refletem, no geral, o interesse por temas supracitados. Imagens de guerra são misturadas com vídeos documentais da Alemanha dos anos trinta. Às vezes, torna-se evidente que o acaso prevalece nestas misturas. Durante um concerto/ataque de Grey Wolves no festival, Heavy Eletronics Two days of agony, foram misturadas imagens de guerra,  destruição com pornografia e a conhecida imagem da banana de Andy Warhol (do primeiro disco do Velvet Underground and Nico). Isso seria uma referência exemplar? Parece extremamente impossível, levando em conta como estes espetáculos costumam ser escutados. As seleções de vozes geralmente tratam de assassinos, ou discursos de Hitler. Esse jogo de imagens, vozes e música fazem que eu observe o espetáculo como algo mais do que somente um concerto. Os grupos também tentam ser algo mais que músicos. Querem aparecer como genocidas, psicopatas, militares ou extremistas políticos. Genocide Organ, por exemplo, atuou muitas vezes com capuzes, dando pauladas no ar e queimando imagens de Bill Clinton. Grey Wolves quer dar uma aparência de grupo terrorista. No começo de um concerto gritaram: "Grey Wolves na área!" Para mostrar que são mais que um grupo, são um coletivo? Se autodefinem como terroristas da cultura e não músicos ou compositores.  É neste ângulo das coisas que pretendo ver todos estes grupos, ou seja, em parte, como artistas de perfomance.
O público conhece no geral este olhar das coisas por meio dos discos e dos encartes. Assim, também, devem ter a perspectiva que são mais atores e/ou ativistas que músicos normais. De certa maneira os músicos se conectam ao mesmo tempo em que mantém uma distância da tradição performática. Quero dizer que se conectam por meio de um grupo musical e de filmes. São assim, justamente, a representação que me causa a sensação de teatro e arte de ação, no qual eu vejo como uma forma de expressão baseada na realidade. Na natureza da arte de ação está incluído ser real. Com-Dom se expressou da seguinte forma na Freak Animal 11 “We are like actors on the stage, playing a part, the difference being that we have an agenda/an ulterior motive - actors for the most part don¹t.” Acredito que está citação também reflete a maneira de pensar do Grey Wolves, pois eles trabalham várias vezes juntos e fizeram ações que mostram uma similaridade de ideias.
Qual é então a finalidade de Com-Dom e Grey Wolves? Se observarmos abaixo das cascas de ambos os extremismos, seja de esquerda ou de direita, encontraremos uma ideologia sustentada em forma notavelmente individualista. Com-Dom escreve em seu manifesto que a finalidade de suas ações não é propaganda política, mas sim uma maneira de influenciar os povos, de mostrar uma realidade que existe e vai além do cotidiano. Escreve (o projeto é apenas ele) em seu primeiro e mais importante texto Statemente of Intent: “The aim is education - A necessary process of de-conditioning. Heightening individual awareness. Revealing the possibilities of existence. Exploring the realities of absolute control.» Pretenciones parecidas tiene Grey Wolves: «Our aim is to pollute the minds of the public, to sow the seeds of insanity into society. /.../ We are working to erase the conforming instinct. To prevent humanity from ever acting with a comon will.” (Manifesto do Terrorismo Cultural).
Meu primeiro pensamento é que esta dupla relação me faz lembrar-se da nova peça teatral de Lars Norén, 7:3, que na primavera passada despertou um grande debate. Há, aqui, uma diferença notável. Em 7:3 os atores são de extrema direita e Com-Dom e Grey Wolves afirmam ser nazistas, porém é bem duvidoso que sejam.  A maior parte dos grupos restantes não são tão abertos em relação à suas ideias, ainda que tentem atuar em um plano mais ambíguo. Não se deve elucidar se são nazistas ou não, no aspecto moral na utilização destas imagens sugestivas, vale a pena analisá-los. Pessoalmente ponho em dúvida as expressões de Grey Wolves e outros grupos.
Este desejo de converter o espetáculo em algo mais que tocar música é interessante já que esta ambição existe quase totalmente dentro do ambiente da música eletrônica (ou possivelmente também no rock psicodélico) ao menos dentro do underground. Um conjunto punk jamais daria um concerto com jogo de imagens. Creio que em parte que seria extremamente chato assistir gente apenas misturando sons, ao mesmo tempo é divertido ver alguém que se entrega por completo a sua guitarra, seu baixo, sua bateria e suas canções. Naturalmente que esta não é a única razão pela qual os grupos em questão realizam espetáculos tipo performance, mas é uma ideia interessante pensar que a utilização de filmes nasceu de uma necessidade funcional.

A revolta autodestrutiva do rock

Iggy Pop começou cedo em sua carreira com diversas atuações, mais ou menos sangrentas, no grupo The Stooges.  Pop se autoflagelava de forma violenta com garrafas e permitia que o guitarrista Ron Asheton, vestido com trajes nazistas, o golpeasse com a guitarra. Ações provocativas que naturalmente os revelava titulares. Durante os anos oitenta o vocalista GG Allin começou a repetir tais ações. Se assistirmos o documentário Hated dirigido por Todd Philipps sobre a vida e obra de Allin, ficaremos assombrados com o cenário criado pelo cantor; o conjunto The Murder Junkies tocando músicas barulhentas e tortuosas enquanto GG Allin,nu, grita sua letra, enfia o microfone no ânus e continua a cantar outra canção, defeca no meio dos ouvintes, entra em violência física com o público que está assistindo e é atacado pelo público. Assim eram os shows que geralmente terminavam com a polícia prendendo as pessoas (durante sua vida Allin foi várias vezes preso por uma variedade de delitos).  A pergunta natural é por quê? O próprio cantor via em suas atuações como uma reconstrução do Rock and Roll. Considerava que o rock’n’roll deveria ser naturalmente agressivo, anti-tabu e deveria mudar a sociedade. No documentário supracitado ele dizia: “My messsage is a message of the rebellion. I¹m a voice of the young America. My message is from the street. I take the street and put it on the stage”. No texto semi manifesto chamado The GG Allin Mission que foi publicado na Absurd 3 - Kalas Mag 2. Allin também escreveu: “Our society want to stop my mission. They want to brainwash you and keep you locked into MTV and their stagnating safe worlds. It¹s a plot to kill rock ¹n¹ roll. I am the savior [sic]. That¹s why I am considered a threat to society./.../ We must live for the rock ¹n¹ roll underground. It CAN be dark and dangerous again. It can be threatening to our society as it was meant to be. IT MUST BE UNCOM-PROMISING”. Desta maneira Allin se conecta em um plano real com um cedo desejo artístico modernista. Porque enquanto os surrealistas e outros diversos modernistas falavam em geral da rebelião e o questionamento das normas da sociedade – Allin realizava ações. Isto mostra que talvez Allin tenha mais em comum com artistas de ação como Chris Burden, Günther Brus e Rudolf Schwazkogler, pois seus autoflagelos são claros antecessores destas ações autodestrutivas de Allin. Isto não quer dizer que ele mesmo se via como um continuador deles.  GG Allin não queria que seus concertos fossem chamados de performance, mas sim de Rock and Roll, pois era rock que ele dizia estar fazendo. O ataque de Allin tem também haver com os deslocados da sociedade, os exibicionistas, os criminosos sexuais e uma série de transtornados bem como artistas de performance. Som estes quem aparentemente GG Allin quer que sejam vistos como seus claros antecessores interligados com diversos músicos de rock como por exemplo Iggy Pop. Ele disse muitas vezes em distintas entrevistas que  seria um assassino se não fosse músico.
Quando não sabemos escrever exatamente sobre um artista, costuma-se dizer que sua vida e obra andam de mãos dadas. São poucos os que esta frase cabe com exatidão como no caso de GG Allin. Sobre seu próprio corpo ele diz em Hated: “My body is the rock ¹n¹ roll temple and my flesh, blood and bodily fluids are a communion to the people. My mind is a machine gun, my body the bullets and the audience is the target”. Ainda que pareça cliché, Allin mostra o fundo da força de ação. Havia prometido há muito tempo que se mataria em alguma apresentação. O suicídio seria a última oferenda e manifesto do rock’n’roll. As promessas seguiram até sua morte por overdose em 1993.
Os concertos de Allin mostram o quanto extremo a arte de ação pode ser usando o corpo como material e não estando nem desejando algo relacionado com a expressão do teatro artificial. Isto o diferencia da maioria dos outros artistas provocativos do rock como a celebridade vazia Marilyn Manson. Naturalmente que também é discutível quão revolucionário e politicamente razoável é fazer os tipos de apresentações que Allin fazia. É evidente a semelhança entra as retóricas de Com-Dom e Grey Wolves com a de Allin. As três tem um especial apelo pela descrição conspiradora do mundo. O mundo da cultura ocidental é uma máscara mentirosa e controlada que necessita uma violenta limpeza, uma catarse, para abandonar esta paz falsa. Se suas análises se parecem, as formas de expressão são diferenciadas em sua intensidade. Com-Dom e Grey Woldes são muitos calmos em suas representações, enquanto que Allin, ao menos em parte, expõe ao público um banho de purificação, claro que não é certeza que surja efeito. É interessante observar que o distinto punk vê suas representações como uma catarse (não se expressava assim nunca, mas pode-se notar similaridades) já que isto que faz podemos ligá-lo facilmente dentro de uma tradição artística. Dito de outro modo, é possível que finalmente, queira ou não, Allin termine representado nos museus, como a maioria dos que se rebela contra o estabelecimento social.
Paralelamente com GG Allin há um punhado de músicos que têm atuado dentro da mesma tradição autodestrutiva. Por exemplo, o jovem Ebbot Lundberg no conjunto Union Carbide Productions, o projeto de noise norueguês Origami Replika e o projeto estadunidense Antiseen. No entanto é Allin quem se tornou ícone do punk e quem fez mais ruído.

O artista de ruído.

Uma quantidade de músicos têm trabalhado o ruído como base para sua criação musical durante o século vinte. Os futuristas italianos foram os primeiros. Mas foi primeiro com John Cage e a música concreta francesa que estas ideias fizeram a época, ao mesmo tempo em que se compõe e se cria música com ruído, se atua. Como predecessores desta tradição podemos ver conjuntos de rock como The Who que rompia com suas guitarras em cena, sem esquecer Jimi Hendrix e sua guitarra em chamas no festival de Monterey em 1968, assim também o sueco Karl Erik Welin e seus ataques ao piano de cauda com motosserra, metralhadora e unha de gato. A finalidade de tais ataques parecem de todas maneiras ser mais simbólicas que musicais.
O projeto The Haters é um conjunto contemporâneo inspirado na performance e com tendência ruidosa. Em uma agenda de concertos extremamente rara publicada no fanzine ND 16, G.X. Larsen em uma turnê pelos Estados Unidos e Europa, escreve o seguinte: “September 28, 1991 -Budapest, Over 200 people packed a small club to see four members of the Haters tear paper and cut fabric and break wood and smash glass”. A agenda continua a descrição bastante crítica e seca. Alguém se pergunta qual a finalidade de suas ações. Realmente não me ocorre outra coisa que Larsen e sua companhia estão encantados simplesmente em romper as coisas com o cenário, com o que estou de acordo. Eu não haveria dado tanto valor à participação em um grupo assim como vê-los atuar em pleno trabalho. Há algo de beleza, sujeira e falta de pretensões na destruição por ela mesma.
Einstüzende Neubauten que foi formado durante a primeira metade dos anos oitenta, trabalhava com uma diversidade de instrumentos como sucatas, brocas, percussão metálica, serras circulares, etc. Trabalhavam musicalmente tanto em estúdios como em apresentações, sempre com este tipo de instrumentos. Nesse detalhe encontramos a característica da performance e ação. Eu creio que provavelmente, o destaque a este detalhe no trabalho de Einstürzende Neubauten nos joga um engano ao musical, já que pode ser esquecido, mas de todas maneiras está ali.  Se Einstürzende Neubauten geralmente deveria ver-se como um conjunto normal com tendências à performance, então ações de Guds söner (Leif Elgren e Kent Tankred) deveriam ver-se como uma unidade.
Sons, objetos e atores trabalham em conjunto para criar uma nova situação. Os objetos utilizados são geralmente muito simples. Uma performance pode durar várias horas com eles somente rastelando terra ou arrastando cadeiras pelo palco,  esta ação cria sons naturalmente. Isto pode ser ver isto como música, mas também é outra coisa. Em princípio se vê algo cômico, logo após transforma-se em uma parte natural da realidade. Medita-se o compasso do som das cadeiras arrastadas. Em Atalante 9, Guds söner escrevem o seguinte sobre a finalidade do seu trabalho: “Tudo (querem dizer a produção do grupo) constitui a base para inventar e revelar momentos inalcançáveis quando a vida cotidiana ascende a uma união com a natureza heroica da vida interna”.  Esta ideia de revalorizar a vida cotidiana, eu vejo como uma herança do movimento Fluxus que queria integrar o happening e a arte ao cotidiano. Devemos interpretar as cadeiras de Guds söner como um desafio como nossa possibilidade de ter uma vida melhor? Eu não sei, mas gosto muito do que fazem.
Guds söner é um dos melhores e mais interessantes grupos nesta curta exposição de ações e arte dentro da música. Sobretudo por suas ideias e suas práticas, além do mais por estar fora de qualquer tentativa de classificação. Seria interessante que mais grupos rompessem as convenções para colocar-se em um campo artístico sem fronteiras. Desta maneira, creio que a performance e a arte de ação pode ser um exemplo para os músicos pouco convencionais.



3 comentários:

  1. E o pateta do Varg Vikernes, novamente na mídia! Não entendo como esse tipo de imbecil se transforma em ícone de cultura pop, é triste dividir o planeta com essa gente...

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  2. Nem sabia desta. Mas o Vikernes tem uma visão de mundo que, aparentemente, está voltando. Estas bobagens de raça melhor, país melhor, neofascismo e besteiras do tipo. Tudo confuso, misturado, entrecortado por um mundo que desistiu de ler História. Não é atoa que a mesma mídia imbecil, dá corda para tipos como Lobão e Roger. Transformam inúteis em ídolos, lembro bem de um monte de gente no colégio e faculdade idolatrando aquela merda com cartola chamado slash. Do outro lado saca isso: http://www.soma.am/noticia/fiz-tudo-o-que-poderia-e-o-mundo-nao-me-quer-diz-glenn-branca

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  3. O Glerm é uma versão 2.0 do Glenn Branca, é só substituir as guitarras por hardware livre

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