Introdução
A história do metal extremo no início dos anos 1990 é muitas
vezes ofuscada por escândalos: queima de igrejas, assassinatos, suicídios e um
folclore sombrio vindo sobretudo da Noruega. No entanto, essa camada
sensacionalista impede que se enxergue o verdadeiro valor artístico, técnico e
musical que emergiu naquele momento. Se o metal dos anos 1980 parecia saturado
após sua explosão nos anos 1970, os primeiros anos da década seguinte marcaram
uma virada estética radical — uma vanguarda sonora que redefiniu os limites do
gênero e inaugurou novos subgêneros com alcance global.
Neste artigo, revisitamos os principais estilos que
emergiram nessa fase — do black ao brutal death — para entender qual deles
representou a maior inovação dentro do metal extremo.
A Vanguarda Negra: Black Metal
O black metal tornou-se o subgênero mais notório por
conta dos acontecimentos na Noruega — e também o mais ridicularizado por sua
estética exagerada: homens seminus correndo pelas florestas com armas medievais
e rostos maquiados. Apesar do visual quase cômico, o som criado por esses
pioneiros foi revolucionário.
A demo Trøndertum, da banda Thorns (1992),
apresentou riffs que se tornaram a base do seminal De Mysteriis Dom Sathanas,
do Mayhem, considerado a pedra filosofal do black metal. Bandas como Burzum,
com faixas como “Jesus’ Tod”, e Emperor e Enslaved (com seu split
de 1993), mostraram que esse novo som — estridente, mas sinfônico — estava
muito além das brutalidades anteriores. O que surgiu foi um estilo único, que
cresceu e se multiplicou em centenas de mutações nas décadas seguintes.
A Marcha da Brutalidade: Death Metal
Enquanto o thrash metal reinava nos anos 1980, nomes como Celtic
Frost, Bathory, Possessed e Death abriram caminho para
uma nova geração mais brutal e técnica. Grupos como Morbid Angel, Deicide,
Obituary, Bolt Thrower e Atheist consolidaram o que hoje
chamamos de death metal: um som definido, extremo e musicalmente disciplinado.
O gênero floresceu em todo o mundo: Vader surgiu na
Polônia ainda sob o regime comunista; na Suécia, bandas como Entombed, Grave
e At the Gates formaram uma verdadeira escola. A Finlândia contribuiu
com Demilich, a Itália com Sadist, a França com Misanthrope
e o Reino Unido com Benediction. Na América do Sul, Sarcófago
(Brasil) e Parabellum (Colômbia) também deixaram sua marca. O death
metal tornou-se uma rede global — uma verdadeira irmandade subterrânea.
O Peso da Lerdeza: Doom Metal
Se o death metal levou a brutalidade ao extremo e o black
apostava em sinfonias agressivas, o doom metal seguiu outro caminho: a
lentidão. Tocar devagar parecia, para muitos, loucura — e talvez por isso o
estilo foi inicialmente recebido com estranhamento e rejeição.
Bandas britânicas como Cathedral e Paradise Lost
abriram portas para nomes ainda mais introspectivos, como My Dying Bride,
Anathema e Esoteric. Mas a semente do doom já havia sido plantada
pelos lendários Black Sabbath e desenvolvida nos anos 1980 por Saint
Vitus, nos EUA. Talvez o maior marco do estilo tenha sido Into Darkness,
do Winter (Nova York), lançado no início dos anos 1990. Obscuro e pesado
como poucos, é um dos álbuns mais influentes do doom. Fora do eixo
anglo-americano, destaca-se também o obscuro Кругами вечности, do grupo
soviético Вой.
O Horror Sonoro: Brutal Death, Gore e Grindcore
Mas ainda havia espaço para transgressões ainda mais
extremas. O goregrind, o brutal death e seus derivados empurraram
os limites estéticos e morais da música pesada.
Os ingleses Carcass lançaram Reek of Putrefaction
com uma capa feita de colagens de cadáveres reais, acompanhada por músicas como
“Manifestations on Verrucose Urethra”. Os americanos Macabre
homenagearam serial killers em Sinister Slaughter. Já os alemães Gut,
com seu álbum Drowned in Female Excrements, misturavam guturais absurdos
com samplers de filmes pornográficos e de tortura — tudo sob o selo de uma
gravadora chamada Semen Records, localizada em um vilarejo com menos de
300 habitantes.
No entanto, o destaque maior ficou para o brutal death
metal, com Cannibal Corpse à frente comercialmente, seguidos por
nomes como Suffocation, Vital Remains, Gorguts, Cryptopsy,
Mortician e os brasileiros Krisiun. A sonoridade chegou a um
ponto de sofisticação perturbadora com bandas como Dying Fetus e,
especialmente, Human Remains. Nesse cenário, a criatividade nascia do
grotesco — e produzia inovações genuinamente radicais.
Conclusão: Qual foi o mais inovador?
O metal extremo dos anos 1990 viveu sua era de ouro
criativa. Todos os subgêneros descritos aqui foram, à sua maneira,
revolucionários. Mas se o critério for a reinvenção estética, a criação de uma
linguagem musical própria e o impacto global, o black metal norueguês
talvez tenha sido o mais inovador — não pelas polêmicas, mas por como seus
fundamentos sonoros ainda reverberam em múltiplas vertentes atuais.
Ainda assim, cabe ao ouvinte — e ao historiador musical —
decidir. E você, qual considera o subgênero mais inovador do metal extremo?
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