Don McCullins - 1972 |
"Pronomes de tratamento
que não merecem nenhum tratamento”
(Vossa Excelência, Vossa Senhoria, Vossa
Santidade, Vossa Magnificência, Vossa Majestade, Vossa Alteza), Vossa
Miserabilidade... Somos bizarros. Pragas que vocês desejam transformar em
senso-comum e padronizar, mas que felizmente não conseguem. Somos estereotipados
pelas suas línguas. Índios. Nazis. Fascitas. Fodam-se. Não estamos preocupados
em enquadrarmo-nos em suas políticas e doutrinas. Chamem-nos de punks,
chamem-nos terroristas. Internem-nos em hospícios. Queimem-nos no inferno.
Não abandonaremos nossa causa,
seja ela rara, absurda, pequena, desconhecida no mundo, mas conhecida em nosso
íntimo, solitária, emanada de sons que evocam nossos gritos, estranhos ruídos
aos seus ouvidos. Somos aversivos. Subversivos. Angustiados. Acreditamos nas
transformações desmedidas desse mundo, enquanto vocês acreditam em nossa
submissão.
Evocamos o livre pensamento. A
liberdade nos possui como o diabo às suas almas. Ao contrário de irmos à igreja
, nossa solidão, nosso envolvimento com a literatura e tudo o que possa se
chamar expressão e arte é a nossa arma e nosso escudo contra a barbárie.
Por isso encontros e reuniões
são o carimbo de nossa força e o selo de nossa luta. Mesmo raras. Temos
sensibilidade para comemorar os valores verdadeiros, diante de um mundo onde as
pessoas esqueceram o que é amor, respeito e cumplicidade.
Ainda que nosso humanismo não
alcance vossos ouvidos e não abrace vossos espíritos alienados, saibam que nada
nos fará desistir de lutar para que cesse a exploração do homem pelo homem e a
ignorância.
Tudo o que amamos, tudo o que pensamos e
sentimos inclinam-se de nossas particularidades. Somos todos únicos.
Tentem nos roubar! Voltaremos a promover a
luta, a esperança e a revolta diante de tudo o que seu sistema vilão insiste em
retirar durante as jornadas de trabalho. Nossos sonhos. Conhecimentos.
Conquistas.
Estamos preparados. Seus
programas não nos seduzem mais. Vigiamo-nos uns aos outros, para que a
abominável noção cristã do pecado criada por vocês não nos influencie e
confunda-nos. Somos fortes. Nosso canto é o da liberdade, da improvisação e da
poesia. Nele é possível perceber o protesto contra toda ordem infundada em suas
bestialidades. Nosso jazz, nossa arte, nossa luta embasada na exaltação da
consciência, cedo ou tarde, varrerá este sofrimento e resignação presentes,
frutos mantidos pelo seu imperialismo social e religioso. Pela proliferação de
tudo o que é senso comum e padrão.
Repugnamos a ideia de pátria,
porque amamos a liberdade. Não concordamos com a pátria histérica, a pátria
vazia, mortal e infundada em valores débeis.
Estamos a par de todas as
guerras e sabemos que muitas se anunciarão sob a hipócrita forma de medidas de
segurança repetidas e multiplicadas. Mais uma guerra que ameaça surgir dos
conflitos de interesses.
Lamentem, não daremos nossas mãos ao Estado,
crente ele de que seremos coniventes com sua tirania, arbitrariedade e sangues
derramados.
Declaramos, a partir dessa
carta, que nossos protestos, nossa arte, nossos sons e vozes, são a recusa a
todo este sistema que não nos permite o começo da paz. Somos a revolta e nossa
revolução é a vingança inelutável do espírito humilhado por suas façanhas e
tiranias. Obras malditas. Seres malditos. Filhos da puta! Vocês não entram em
nossas casas. Não manipulam nossa arte. Nossas mãos. Nossa mente.
Nossa poesia não é mera
ilusão, é a arma contra os espíritos paternalistas. Por isso blasfemamos. Nosso
insulto é a nossa voz. Ouçam: “Vão pra
puta que os pariu!".
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