quinta-feira, 22 de outubro de 2015

Negro Leo - niños heroes

“Todo o tempo é inútil, não só do menino, ou todo o tempo é como o dele, o que acontece, o que entusiasma ou dói no tempo se acusa apenas um instante, depois se perde e é escorregadio como a neve compacta e como é para o menino seu sono de agora, deste mesmo instante. Tudo é para todos como para ele eu sou agora, uma figura quase desconhecida que o observa do umbral da sua porta sem que ele saiba e nunca vá saber, nem vá portanto saber lembrar, os dois viajando para nossa esfumação lentamente. É tanto mais o que acontece às nossas costas, nossa capacidade de conhecimento é minúscula, o que está do lado de lá de um muro já não enxergamos, o que está à distância, basta que alguém cochile ou se afaste uns passos para que não ouçamos mais o que está dizendo, e pode ser que a nossa vida nisso, basta que não leiamos um livro para que saibamos a principal advertência, não podemos estar em mais de um lugar em cada momento, e mesmo então muitas vezes ignoramos quem estará a ponto de discar nosso número, quem de nos escrever, quem de nos querer ou nos procurar, quem de nos condenar ou assassinar e assim acabar com nossos escassos e malvados dias, quem de nos lançar no revés do tempo ou ao seu negro dorso, como penso e contemplo eu e esse menino sabendo mais dele do que ele saberá sobre o que foi essa noite. Eu devo ser isso, o revés do seu tempo, o negro dorso…Javier Marias. 


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